Segundo esta pesquisa realizada em 2006, no processo de escolha, enquanto os orientadores valorizam as características técnicas, os orientandos focam nas afetivas e pessoais. A pesquisa também verificou que muitos dos problemas que ocorrem durante o processo de produção da pesquisa estão ligados a relação Orientador-Orientando. Portanto, estabelecer uma boa relação é uma condição para o sucesso na tarefa.
Quando pensei em escrever este tema, tive uma dúvida. Escrevo com o objetivo de conscientizar o Orientando a tomar a iniciativa nesta relação, ou para o Orientador? Qual deveria ser o foco? Aluno ou Professor? No fim, cheguei à conclusão nenhuma. Resolvi escrever para ambos.
Se você ouvir os alunos que já terminaram suas pesquisas, boa parte fará críticas ao tratamento recebido de seus respectivos orientadores. Se você ouvir seus professores, boa parte lembrará dos erros e problemas que existiram na parceria.
O que talvez nenhum dos dois lados faça, é se colocar no lugar do outro, a famosa empatia. Se você procurar, vai encontrar motivos para justificar os defeitos do outro (como explico logo abaixo). Todo Orientador já foi orientado por outro professor. E todo “Orientando”, em alguma atividade – principalmente no trabalho – já foi orientador de alguém. Portanto, basta cada um relembrar “como é estar do outro lado”, e evitar situações que desgastem a relação.
Mas na realidade, a relação não é tão simples assim de resolver. Se você já frequenta “O Orientador Online”, já sabe que tenho um fascínio em aprender sobre como funciona a mente humana (meu estranho hobby). E graças a este hobby, sei porque tantos alunos quanto seus orientadores tendem a falar mal um dos outros. Está relacionado à como nossa mente guarda e prioriza as memórias.
TEMOS UMA MENTE NEGATIVA
Diversos pesquisadores da neurociência, em especial Daniel Kanneman, afirmam que uma memória relacionada a sentimentos negativos, ou classificada pela mente como negativa, precisa de menos reforço para fixar no longo prazo. Encurtando a explicação, é mais fácil guardar uma memória negativa do que uma positiva e, consequentemente, também é mais fácil relembra-la.
Por isso que as rodas de conversas entre veteranos e calouros sobre TCC e monografias, e entre professores, gira nas memorias negativas desta relação. Infelizmente é algo natural para nossa mente. São mais fáceis de guardar e lembrar. E isto se reflete em todas as outras relações que temos.
O maior problema disso, é que ninguém discute como fazer para essa relação ser boa. Apenas se discute o que deve ser evitado para não ser ruim. Afinal, são as nossas memórias “mais marcantes”, mais vívidas em nossa mente sobre a relação. Neste artigo vou abordar, além do que deve ser evitado, o que deve ser feito, as boas práticas para relação ser produtiva.
ESTABELECENDO UMA RELAÇÃO POSITIVA
Como em qualquer relacionamento entre duas ou mais pessoas (seja afetivo, profissional ou meramente cordial), seu sucesso ou fracasso gira basicamente em dois aspectos. Uma boa relação exige um respeito de ambos, e uma boa empatia com o outro.
O respeito é algo que deve ser conquistado. Se você precisa exigir respeito, nunca o terá. O Orientando precisa respeitar as decisões tomadas por seu Orientador – desde que devidamente fundamentadas – as questionando de forma educada. E o Orientador precisa respeitar as decisões e opiniões do Orientando sobre seu próprio trabalho.
E a melhor forma de conseguir respeito mutuo é ambos exercendo empatia. Empatia é o ato de se colocar no lugar do outro, sentir o que ele sente, pensar como ele pensa. Isto é fundamental para que cada um entenda exatamente o que o outro quer dizer com determinada orientação/questionamento. Não significa concordar com o outro, mas entender os motivos daquela atitude.
No fim, é igual qualquer relação amorosa ou de amigos. Se não existir respeito e empatia, não haverá relação. E, portanto, não renderá frutos desta parceria. No fim, ambos desejam que a relação dê certo. Basta que este desejo se reflita nas atitudes e comportamentos ao longo do relacionamento.
OS MAIORES MOTIVOS DE DESGASTE DA RELAÇÃO
Já disse – aqui no blog, em outros textos – que o bem mais valioso que existe é o tempo. E este costuma ser bem escasso, para todos nós. Para que o tempo não seja um problema, estabelecemos prioridades. Fazemos escolhas. Tomamos certas decisões. É natural, afinal não podemos fazer tudo que queremos. E é em torno destas escolhas e decisões que ocorre o maior motivo de desgaste da relação entre orientando e orientador.
Na visão do aluno (Orientando), o projeto de pesquisa é uma das várias outras matérias do semestre. O Orientador é um dos vários outros professores do semestre. Assim facilmente se chega a conclusão que o tempo deve ser DIVIDIDO entre tais matérias e professores. Nada de dedicar “exclusividade” a um ou outro.
Na visão do professor (Orientador), orientar a pesquisa é uma das várias outras atividades da sua função. O Orientando é um dos vários outros orientandos do semestre. Novamente é óbvio chegar a conclusão que o tempo deve ser DIVIDIDO entre tais atividades e orientandos. Nada de dedicar “exclusividade” a um ou a outro.
Se você acompanhou o raciocínio lógico acima, deve estar se perguntando: Mas onde está o problema? Está nas atitudes que AMBOS tomam, exigindo “exclusividade”, tempo exclusivo (e não dividido).
01 – CRONOGRAMA MAL FEITO
Desde o professor que coloca prazos irreais para atividades trabalhosas, quanto ao aluno que deixa tudo para a última hora. Não ter claro, estruturado, definido e bem dimensionado o planejamento da atividade, é um grande desgaste.
É aquela coisa que “nem começou e já começou errado”. E sempre é uma via de mão dupla. Se o cronograma foi mal feito, penaliza ambos. Professor alocou excesso de trabalho? Argumente e mostre isto, filtre as atividades, com foco apenas no mais importante.
Aluno entrega tudo de última hora? Aperte os prazos, quebre as atividades grandes em atividades bem menores, mais rápidas, frequentes. Deixe claro a ele quanto tempo você levará para devolver corrigido, e mostre no planejamento que os atrasos do aluno acabam com o planejamento.
Um bom cronograma permite que ambos adiantem suas obrigações – principalmente o orientando, quem realmente deve trabalhar – e também permite uma agenda bem regrada, sem imprevistos ou “ajustes de última hora”. Isto também dá margem de manobra para imprevistos. Estes sempre aparecem – e quase sempre na pior hora.
02 – BAIXA PRODUTIVIDADE
Este normalmente é causado mais pelo aluno que pelo professor. Mas AMBOS podem cometer. Um cronograma mal feito também leva a um progresso do trabalho confuso, desorganizado. Isto tudo resulta em desperdiçar o tempo de ambos. No fim, baixa produtividade.
Ter um bom planejamento e organização facilita para observar a evolução clara da atividade. Também permite tempo para solucionar problemas não previstos. Falando em problemas, caro aluno, dependa pouco do seu Orientador. Tente resolver antes de pedir auxílio. Tenha iniciativa (de preferência com “acabativa”). Afinal, a atividade é sua. O Orientador orienta, você faz.
E meu caro Orientador. Solte a coleira e deixe seus alunos se virarem um pouco, tentarem fazer primeiro. Não fique a todo momento dizendo exatamente o que eles devem fazer, como fazer, onde fazer. Não seja rígido a este ponto.
03 – RESOLVER OS PROBLEMAS “SOZINHO”
Acreditem, esta atitude ajuda ambos. O Orientando é mais produtivo, pois resolve os problemas por conta – quanto mais problemas resolver, melhor será em resolver problemas! E com menos problemas pendentes, menos tempo da sua orientação é necessária. Assim ambos sobram tempo, no fim das contas. E isso sim é produtividade.
Aqui, tive um bom exemplo prático de como ter um Orientador organizado e focado faz bem para ambos. Já falei em outro artigo que eu, Edson Moser, sou péssimo com prazos, principalmente frouxos. E também não sei lidar com grandes tarefas.
Meu Orientador sabia disso. Então ele me passava pequenas tarefas focadas, mas com prazo curto (5-10 dias) para entrega. Isso foi fundamental para que eu não perdesse os prazos, e conseguisse produzir muito, comparado aos demais colegas.
04 – REUNIÕES OBJETIVAS EFREQUENTES
Já que falei do meu Orientador, vou usá-lo novamente. Como eu tinha tarefas pequenas, e nossasreuniões eram semanais, ou no máximo 15 dias de intervalo, toda pauta das nossas reuniões era curta. Dois ou três pontos a tratar apenas. 20-30 minutos de conversa era suficientes para falar do que foi feito, resolver o que ficou pendente e planejar a próxima entrega. Com data e pauta da próxima reunião também agendada.
Essa pauta das reuniões era exatamente as atividades que precisava executar. Foi assim que uma atividade complexa e extensa como minha pesquisa, pode ser executada rapidamente e degrau a degrau. Também ajuda o fato de as reuniões serem frequentes, assim eu evitava parar ele no corredor, pois logo teria a reunião para tirar minha dúvida.
Então, aqui fica um conselho. Prefiram encontros mais curtos e frequentes, do que orientações longas e distantes. Quebrem as tarefas em poucos pontos, no máximo três. Assim o acompanhamento é mais próximo, as atividades não acumulam ou ficam para a última hora (sempre é a semana pra fazer).
Ah, uma coisa bemimportante. Ele sempre me dava o mesmo prazo que ele teria para corrigir atarefa. Se tinha 5 dias para fazer, ele também levava isto para me devolvercorrigido (a minha entrega sempre era na metade do tempo de intervalo entre asreuniões).
E por fim, gravem estasreuniões. Ninguém vai lembrar de tudo. Ter um áudio registrado é perfeito.Ambos podem recorrer a ele para lembrar o que foi acordado, sem precisar ficarmandando e-mails ou marcando reuniões extras com pressa, bagunçando a agenda de ambos.
MOTIVOS EXTERNOS ARELAÇÃO QUE TAMBÉM PODEM DESGASTA-LA
Os motivos anteriores são
diretos da relação entre o Orientando e seu Orientador. Mas também existem
motivos externos, indiretos a esta relação. Estes basicamente se referem ao
“fruto” desta relação. A pesquisa a ser executada.
Tanto Orientando, quantoOrientador, tem expectativas pessoais e profissionais (assim espero) com oresultado final da pesquisa. Para o aluno, além de concluir a atividadeobrigatória, espera com sua pesquisa ter resolvido um problema da suaempresa/comunidade, mostrando seu real valor. Ou ainda, render publicaçõescientíficas, se o objetivo for a continuidade da carreira acadêmica.
Já para o professor,normalmente tudo gira em torno do impacto científico do estudo e daspublicações obtidas com tal pesquisa. A carreira de professor/pesquisadorimplica necessariamente em volume de estudos relevantes publicados.
Quanto mais relevante ele for como pesquisador (mais estudos publicados nos melhores periódicos), maior será seu progresso na carreira. Portanto, só existe um cenário onde não haverá muito desgaste desta relação. Produzir uma pesquisa de relevância.
01 – RELEVANCIA DAPESQUISA
Conduzir um estudo publicável – quanto maior o Qualis (nível de relevância da publicação, segundo a CAPES), melhor. E que também cause impacto onde for conduzido. Essa é a melhor maneira de estabelecer uma relação ganha-ganha para ambos.
OBS: Eu falo publicável, pois a pesquisa em si não precisa obrigatoriamente ser publicada pelo aluno (salvo regras da instituição e curso), mas com certeza o Orientador terá interesse na sua publicação. Por isso a pesquisa deve ser publicável, relevante para periódicos científicos.
Uma pesquisa cujo interesse for apenas acadêmico, é ruim para alunos “pró-mercado”, e para a comunidade em geral. Uma pesquisa voltada apenas ao problema local, sem impacto científico, não ajuda na carreira do professor, pois é de difícil publicação em periódicos importantes.
Por fim, fazer algo mal feito, desorganizado e sem importância, vai levar o mesmo tempo e esforço (ou até mais) que algo relevante. Portanto, já que precisa fazer, faz bem feito. Faz com que este trabalho “obrigatório” renda frutos, para ambas as carreiras.
02 – PRODUÇÃO DA PESQUISA
Além dos pontos já abordados relacionados ao planejamento da atividade e gerenciamento do tempo, existem outros pontos da atividade que podem causar desgaste na relação.
É raro encontrar problemas nas atividades de meio da pesquisa, afinal houve um planejamento acordado (projeto de pesquisa aprovado por banca) o qual deve apenas ser seguido. Se não for seguido, não há divergência. Há incompetência.
As divergências voltam no momento de finalizar a atividade, principalmente com relação ao termos, linguagem e tópicos escritos. Mas primeiro vamos abordar a questão da organização e formato do trabalho.
03 – ORGANIZAÇÃO DO TEXTO
Aqui o desgaste é mais do professor com o aluno. Afinal é o aluno quem escreve. As decisões de como organizar os tópicos, devem observar uma fluidez lógica dos assuntos, e cronológica da sua execução. Voltando a questão de ser organizado. O texto precisa ser claro para quem o lê. E o Orientador vai lhe cobrar por isso, antes que seu texto chegue para análise direta da banca.
Se o Orientador precisar reler várias vezes, ou voltar no texto para entender algo, serão pequenos detalhes que alimentarão o lado “negativo” da relação. Evitem estes pequenos aborrecimentos. Usem métodos para organizar logicamente e com fluidez os tópicos do seu assunto.
DICA DO ORIENTADOR ONLINE – Aprenda a técnica dos mapas mentais. É uma das formas mais simples, fáceis (depois que você domina a técnica) e práticas para organizar os tópicos de qualquer texto. Inclusive, uso exaustivamente em todos os textos e roteiros de vídeos que produzo, tanto pessoal quanto profissional. Ah, poupa muito tempo de escrita! Além facilitar a organização, aumenta a produtividade.
Voltando a relacionar ao tempo. Quanto mais organizado e fluido o texto, menos tempo é necessário para ler e corrigir. Assim temos produtividade. Para ambos. Poupe tempo. Se tem normas de formatação, já crie o texto no formato correto. Acredite, é mais rápido e melhor para ler do que um arquivo sem formato definido.
04 – LINGUAGEM DO TEXTO
Aqui é uma explicação extra sobre a fluidez de um texto. Use uma linguagem fácil de entender, sem muitos termos técnicos e sofisticados. Facilite a leitura. Use expressões curtas, objetivas, claras.
Cuide da gramática. Erros de gramática “sequestram” a atenção de quem lê, e esta pessoa acaba “esquecendo” sobre o que era o assunto. Portanto, vai precisar reler aquele trecho – assim que conseguir ignorar o erro, ou corrigi-lo.
Talvez pela forma ou pela rigidez do método científico, há uma tendência natural em fugir da linguagem simples e concisa. Ou até pelo foco excessivo no assunto, onde adquirimos muito conhecimento especializado sobre aquilo, esquecemos que nem todos tem tamanho conhecimento.
Quem vai ler, nem sempre sabe todos os termos, expressões e códigos da linguagem da sua área de pesquisa. Faça com que pessoas extremamente leigas ao assunto consigam compreende-lo. Quanto mais simples e fácil a compreensão, mais fluido é o texto, e maior é a sensação de satisfação em ler aquele trabalho. E melhor é a nota #ficaadica.
Ah, claro, quanto menor for o tamanho deste seu texto, obviamente menos tempo é necessário para ler e corrigir. Então seja, conciso. Seja direto. Não enrole, nem encha seu texto de conteúdo fútil. Mais uma vez, foco no que é preciso, somente no que é preciso. O resto, deixa fora.
DICA FINAL
Para finalizar este longo texto, quero que você volte para as duas características principais para estabelecer uma boa relação (seja ela qual for, não apenas a foco deste artigo). Empatia e Respeito.
Elas devem ser suas guias em toda e qualquer ação (seja você Orientador, ou Orientando). Saiba dosar as atitudes para não abalar a relação, seja por falta de respeito ou por exigir algo que o outro não poderá fazer.
Por fim, não crie expectativas com esta relação. Quando criamos uma, estamos estabelecendo um ponto de referência. Se você criar algo muito grande, vai se frustrar com a realidade.
Voltando a abordar a pesquisa citada na introdução. Orientadores, não esperem um pesquisador maduro e produtivo. Seus orientandos estão começando. Vão mais errar que acertar. É normal, é natural. Faz parte da vida.
Para a maioria, será a única experiência prática da pesquisa. Portanto, lhes indique a estrada certa, mas não peguem na mão e levem o tempo todo. Deixe-os seguirem por conta própria, para aprender um pouco sozinhos.
E caro Orientando. Seu Orientador não será seu amigo pós faculdade (talvez até seja, mas não crie esta expectativa). Não é um terapeuta que vai ouvir suas angústias. Nem seu ombro amigo. Ele tem os seus problemas também. Então não seja mais um. Faça o seu trabalho. A pesquisa é sua, não do seu Orientador.
Caso tenha interesse, este texto lhe indica o que você pode esperar e o que você não pode esperar do seu Orientador. Além de dar mais dicas sobre a relação, além das que aqui abordei.
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